quarta-feira, 31 de maio de 2006

O encantamento da leitura

(Prefácio ao livro Ler faz bem à alma, de Donizeti Costa)

Roniwalter Jatobá


Há muitos e muitos anos, pai e filho cavalgavam pelo vale fértil de Bananeiras, um vilarejo no sertão baiano e encravado no final da Chapada Diamantina. Na estrada cercada de vastas plantações de banana e cana-de-açúcar, riachos em corredeiras, os animais passavam pisando macio no chão de terra úmida e vermelha. De repente, o menino emparelhou o seu animal junto ao do pai, e disse:

-- Um dia vou-me embora deste lugar.

O pai olhou para o menino sabendo que sim -- sim, um dia ele iria embora. O pai tinha certeza: o menino queria conhecer outros mundos e tinha sede de saber.

De repente, o pai estancou seu cavalo. Desceu com tranqüilidade entre troncos caídos e a cerca de arame farpado, e reapertou a sela no lombo do animal.

-- Sei disso -- disse. -- Na sua idade eu também pensava assim.

O menino ia completar 12 anos. Desceu também da sua montaria com a agilidade de bom cavaleiro. Aí, frente ao olhar do pai, segurou nas rédeas o cavalo impaciente.

-- Vou ser escritor - disse com a maior naturalidade como se fosse a mais fácil e normal profissão do mundo.

Muito tempo depois, prestes a lançar o seu terceiro livro de ficção, aquele menino recordaria, palavra por palavra, o diálogo da breve história contada acima e daquele momento com seu pai, um sertanejo semi-analfabeto, conhecedor, porém, das artimanhas da vida.

Dias antes do lançamento do livro numa grande livraria da avenida Paulista, em São Paulo, aquele menino -- que na verdade sou eu agora – passou noites se perguntando: como um filho de pais não-letrados tinha se tornado escritor?

Numa madrugada de reflexão, “caiu a ficha”. Eu, o menino que virou escritor, havia lembrado dos responsáveis por isso: os professores do Ginásio Augusto Galvão, em Campo Formoso (BA), que gostavam de literatura e sabiam levá-la aos pequenos leitores. Nas suas viagens a Salvador, a capital baiana, traziam as novidades do mundo livresco. Lembro, entre muitas coisas bonitas, de O pequeno príncipe, do francês Antoine de Saint Exupéry ou de O velho e o mar, do norte-americano Ernest Hemingway. Eram obras de qualidade literária, mas propícias para jovens que tateavam na leitura e na literatura.

Alguém já disse que aprender a gostar de ler é um processo simples. É como aprender a caminhar ou andar de bicicleta, por exemplo. No começo você balança o corpo para um lado e para o outro e, depois de algum tempo, você já está dando os primeiros passos ou as primeiras e seguras pedaladas. Na leitura é a mesma coisa. Primeiro precisamos despertar o interesse, o jeito cativante das frases explodindo na imaginação e a vontade de não largar aquele objeto conhecido como livro. Aí, depois, o gosto e o prazer pela leitura.

Este livro de Donizeti Costa – Ler faz bem à alma – caminha na mesma direção do grupo de professores de minha formação. Vai contra a corrente ou contra a maré do precário ensino de literatura em boa parte das escolas do país. Em capítulos curtos e em linguagem acessível, aborda o panorama do livro e da importância de ler. Em resumo, a obra mostra que, por meio da leitura, podemos viajar por outros mundos em qualquer tempo e lugar, conhecer a história da humanidade e, principalmente, saber mais de nós mesmos e do mundo em que vivemos. Uma viagem, portanto, à anatomia do livro e ao encantamento da leitura.

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