Fernando Busian*
Esqueça os manuais de management de gurus como Jack Welch e Robert Kaplan. Clássicos da literatura nacional, como O Alienista, de Machado de Assis, e Grande Sertão Veredas, de João Guimarães Rosa, podem servir como inspiração para a tomada de decisões de gestores. Quem aposta nisso é o professor Renato Ferreira, da Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo. Há três anos, ele ministra, aos alunos do curso graduação em Administração de Empresas da instituição, a disciplina Gestão com Pessoas e Literatura.
Segundo Ferreira, não há mistério em descobrir subsídios para gestores em obras de ficção, pois um livro tem diversos modos de ser lido. “O que faço é escolher uma possível leitura, focando nos processos de tomada de decisão e nas relações de poder, encontradas no ambiente corporativo”, diz. Citando o exemplo de O Alienista, o professor da FGV-SP diz que a obra mostra perfeitamente a questão do poder e de sua legitimação, com as tramas em torno da história do doutor Simão Bacamarte, um médico português que chega a uma pequena cidade do interior do Rio de Janeiro para estudar a loucura e acaba construindo um hospício no local.
Inicialmente, os alunos sentiram certo estranhamento ao entrar em uma sala de aula para aprender gestão e se deparar com aqueles livros que só são lidos por conta da obrigatoriedade dos exames vestibulares. A disciplina não é obrigatória, mas Ferreira conta que todas as vagas disponíveis são preenchidas. “Agora, a disciplina já é conhecida; os alunos que a cursam acabam indicando aos demais colegas”, relata ele, satisfeito com a aceitação. “Eles [alunos] acabam despertando para a leitura e aumentam seu repertório, não só para a carreira, mas para a vida.”
Ferreira não foi o inventor da idéia de usar clássicos da literatura no curso. Ainda nos anos 1980, quando era aluno de graduação na mesma FGV onde leciona hoje, ele foi aluno de um professor que também usava exemplos da ficção, deixando os manuais acadêmicos um pouco de lado. “Fiz a proposta de resgatar isso na FGV e deu certo”, relata. Ferreira destaca que seu curso não é de literatura. Ela apenas é uma ferramenta. “Fazemos análise e discussões, para reflexão dos exemplos.”
Nascido
Nessa troca de correspondências, o jovem Drummond é estimulado por Andrade a seguir seu sonho de ser poeta. Ferreira também recebeu o estímulo e hoje colhe frutos da sua paixão pelas letras, ao associá-la com sua formação acadêmica. Em aula ministrada na última semana, Ferreira trabalhou com seus alunos o conto machadiano “Um homem célebre”, que traz a história de um pianista que quer se tornar conhecido por ser um compositor de clássicos, mas só consegue sucesso com polcas, muito populares no século XIX. Ferreira pinça uma frase desta obra de Machado de Assis e que cabe bem na gestão de pessoas: ”A vida é uma eterna peteca entre a ambição e a vocação.”
Veja a seguir algumas dicas do professor para quem quer se aventurar pela literatura com viés para a gestão. Ele observa, entretanto, que a leitura é mais rica "quando não ficamos ansiosos em tirar dela lições de vida, mas sim compreender situações de vida, aumentando o nosso repertório e sendo penetrados por essa erudição não do conhecimento, mas do entendimento. Ou seja, não instrumentalizar a leitura, mas vivê-la", aconselha.
1) 50 Contos de Machado de Assis – organização de John Gledson – Companhia das Letras
2) Trabalhadores do Brasil (coletânea de contos organizada por Roniwalter Jatobá) – Geração Editorial
3) A borboleta amarela – um lindo livro de crônicas do Rubem Braga – Editora Record
4) Primeiras Estórias – Guimarães Rosa (com contos maravilhosos como “A terceira margem do rio”, “O Espelho”, “Famigerado”) – Editora Nova Fronteira
5) Aprendendo a viver – Clarice Lispector – lindas crônicas que continuam a nos rondar muito tempo depois de as termos lido.
*Fernando Busian escreve no CanalRH (www.canalrh.com.br)
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